Galiza é o País dos tempos perdidos.

Por José Paz Rodrigues, Professor reformado da Universidade de Vigo e Presidente da ASPGP.

Como formador que fum durante quase quarenta anos dos futuros mestres de educação infantil e primária, na Escola Normal e Faculdade de Educação de Ourense, muito gostaria que nos diferentes estabelecimentos de ensino se organizassem atividades lúdicas e artísticas variadas sobre a nossa literatura, as nossas artes e o nosso rico património natural e artístico. Para elevar a autoestima dos escolares galegos, de crianças e de jovens. E superar o baixíssimo auto-conceito que os galegos e as galegas têm, desde faz séculos. Porque Galiza é, por desgraça, aínda o “País dos tempos perdidos”. Um tema que quero lembrar agora que estamos às portas de uma nova edição do “Dia da Pátria Galega”. Que coincide também, por desgraça, com as numerosas perdas económicas dos últimos tempos: as nossas caixas, as hidroeléctricas, muitas empresas, a banca galega…

Muitos galegos e galegas não sabemos que pecado temos cometido para sofrer o que temos sofrido desde há tempo. Mesmo desde há séculos e séculos. Desde a desgraçada morte e decapitação dos Irmandinhos. Desde a doma e castração do reino da Galiza, iniciada pelos chamados Reis Católicos, sinalada por Zurita e comentada por Castelão. Desde a brutal castelhanização levada a cabo em seminários e mosteiros galegos, e também nas escolas. Desde a longa noite de pedra, da que falavam Celso Emílio e o poeta brasileiro Drumond de Andrade. E antes, desde a despiadada persecução durante a guerra incivil. Quase desde sempre e, o que é mais grave, desde agora mesmo. Quánto tempo temos perdido na Galiza! Quánto tempo estamos aínda a perder! A nossa Galiza pode perfeitamente chamar-se “o País dos tempos perdidos”. Sem ir tão longe históricamente, gostaria-me comentar passo a passo hoje cada um dos tempos perdidos mais importantes:

1.-Ao contrário do feito por catalães e vascos na transição post-franquista, enlaçando com o periodo republicano, os primeiros presidentes dos seus governos autónomos foram, respeitivamente Tarradellas e Aguirre. Nós tinhamos a Osório Tafall. E, noutra vergonhenta atuação típica galaica não foi aceite. Preferimos silenciar aos culpáveis disto, que foram maioria. E não tivemos presidente histórico.

2.-Mais do mesmo. Catalães e vascos souveram manter a ligação com as suas forças políticas históricas, mantendo-as no exílio para recuperá-las logo na sua terra. Nós não, nós matamos o Partido Galeguista dos Castelão, Otero, Bóveda… Um dos máximos culpáveis, senão o que mais, foi Ramóm Pinheiro. Logo não tivemos uma força autêntica à que enganchar-nos. E aínda hoje não a temos, porque também fumos matando logo Coaligação Galega, PSG e PNG, para lhas entregar a outras forças. E seguimos a pagar isto e o pagamos durante anos e anos.

3.-Não souvemos, não quigemos ou ao melhor não pudemos, recuperar aquele nobre Seminário de Estudos Galegos (SEG). Entidade modélica para a investigação da nossa cultura secular. Vascos e catalães sim souveram recuperar as suas semelhantes entidades.

4.-Nas primeiras eleições democráticas depois da morte do ditador, o PSOE, que não tinha na Galiza a quase ninguêm, ofereceu-lhe ao PSG (Partido Socialista Galego) os postos ímpares nas listas eleitorais. Os galegos não aceitaram e o seu fracaso eleitoral foi escandaloso. Os “parvos” dos catalães sim aceitaram. Comparem hoje ao PSC catalão e ao PSOE galego, grupo no que todos estam contra todos.

5.-A princípios dos oitenta existia uma força política inter-classista impressionante, com muita militância. Estamos a falar da ANPG (Assembleia Nacional Popular Galega). O estalinismo, dum dia para outro, por perder o seu controlo, num ato realmente fascista e do mais anti-democrático, sem escuitar aos muitos dos seus militantes, matou-a. E logo já sabemos que governos tivemos na Nossa Terra.

6.-Pelas mesmas datas, o ILGa toma a Academia Galega, igual que está agora, e, a proposta dum asturiano e o seguidismo de muitos, uns conscientes e outros não, impõe-se por decreto como se devia escrever a nossa língua, sem permitir qualquer debate. Ao contrário do que se fez com outros idiomas em outras latitudes. Afastándo-nos do nosso mundo lingüístico, da filologia romanística e do senso comúm. O demais já o sabem todos. Cada vez mais perda de galego-falantes. E o tema segue com os herdeiros de aqueles.

7.-Levavamos um tempo com certo sossego no tema lingüístico na Nossa Terra. Semelhava que se estava impondo um certo respeito entre as duas opções lingüísticas. A foneticista e a etimológica, a castelhana e a histórica, a isolacionista e a reintegracionista, a reducionista e a universalista-lusófona… O tema começou com o artificial debate sobre o nome do nosso país. Foi a porta para a decissão de dedicar as Letras Galegas do ano 2009 a um dos máximos culpáveis daquela decissão ao nosso entender muito equivocada, sobre o famoso decreto normativo. Este foi precisamente Ramóm Pinheiro. Com o que estivemos antes de promulgar aquele decreto para que não cometera o erro que, ao fim, ele e Filgueira cometeram. Este era um momento para sumar e não restar, para unir e não dividir aos galegos sobre este tema. Para dialogar e debater, que tanta falta faz… Não para que a Academia da rua das Tabernas tomara esta decissão. Se o que os académicos pretendiam era dividir aos galegos, na luita pela tão necessária recuperação da nossa língua, não podiam escolher personagem mais idónea. Que ademais quase não tem obra literária. Para nós é este o enésimo tempo perdido na Galiza. E aínda hoje, tal como bem de dizer muito acertadamente sobre a RAG Juan Soto, “confiamos em que se ponha termo a situações não já absurdas, senão ridículas, tais como o veto irracional a Ricardo Carvalho Calero para personalidade epónoma do 17 de maio” (são palavras exactas de Soto). Qué bom seria que não houvesse no futuro mais tempos perdidos! E que a Galiza deixara de ser “o País dos tempos perdidos”, para converter-se no País dos tempos recobrados. A esperança de que tal cousa suceda está nas crianças, adolescentes e jovens de hoje, que hão ser os homens da Galiza do amanhã. De aí a importância de trabalhar em todos os ámbitos, especialmente no escolar, para promover entre os rapazes o amor pela sua Terra e a defesa do seu idioma e da sua cultura.